Visitante nº

quinta-feira, 16 de abril de 2009

DONA JÚLIA GALO

Dona Júlia era uma pequena comerciante na cidade de Simão Dias-SE. Tinha uma bodega na lateral do mercado da farinha, na antiga rua da Feira, coronel Loiola. Em seu pequeno comércio vendia cachaça, jurubeba, leão do norte, jaca, banana, manga, laranja, bala, pão, bolachão. A venda era bem sortida. Se quisesse ser xingado a chamasse de Júlia Galo. Podia preparar o que a mãe tinha debaixo da saia. O autor do apelido até hoje ninguém sabe.
Dona Júlia Galo, espero que ela não venha do outro lado da vida: me xingar e dizer onde encontra o Galo. Era uma pessoa alegre, dizer o que pensava era com ela mesma. Cachaceiro não pagou a conta, o cacete comia. Vendia cachaça, tolerar bêbado, vá para a p... que pariu.
Sempre gostei de gente grande. Conversa de adultos eu gostava de ouvir. Muitas vezes, meu pai me expulsava, dizendo:
-Vai ver se eu estou na esquina.
Confesso, que na minha inocência, ainda fui à esquina. Com o tempo, vim a entender a mensagem. Quando meu pai falava com os amigos safadezas, vinha a mensagem, que de novo não vou repetir. O tempo é um grande professor.
Voltemos a dona Júlia Galo. Fui por muito tempo seu freguês. Quase ninguém confia em menino, besteira! A criança possui credibilidade, adulto é uma perdição. Menino fica mentiroso, quando cresce. Gostava de conversar com a velha. Deu-me crédito, vendia fiado.
Pão com banana era minha merenda preferida. De vez em quando, retorno ao tempo de criança.
Estudava eu no Grupo Escolar Fausto Cardoso, no alto do prédio havia uma águia, depois, quando já grande, em tamanho, é claro, estudando, pesquisei que a águia é uma construção do presidente do Estado de Sergipe (Governador) Graccho Cardoso que governou de 1922 a 26. Matei a curiosidade de infância.
Matemática nunca foi o meu forte, tinha pela matéria uns arranhões, cheguei a melhorar quando fui estudar no Colégio Carvalho Neto na mesma cidade de Simão Dias. Português aí sim, quebrava meus galhos. Leitura ficava eu vaidoso, quando a professora dona Aliete mandava eu ler, engrossava a voz, botava uma banca danada. O Claudemir era gago, não hora da leitura era uma agonia:
"iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii"
No instante de xingar a mãe do colega , o cabra era rápido no gatilho.
Para nossa alegria, menino gosta do mal feito, um certo dia, dona Aliete deu um tapa na boca do gago. Rimos muito, festejamos.
Nos outros dias, o gago melhorou a leitura. Ainda dizem que pancada não conserta.
Vamos parar de enrolação, coisa de adulto, dona Júlia Galo era analfabeta de carteirinha. Quando queria escrever para seus filhos, era comigo mesmo. Fui por muito tempo seu redator-chefe. De vez em quando, eu acrescentava na redação.
Dona Júlia estava com raiva de seu filho Rafael, queria dizer os sentimentos d'alma, o sujeito nem aparecia na casa da velha. Já sabia que dona Júlia não mandava recado, falar o que pensava, igual a ela só o velho Pedro Mendes. Na falta do fugitivo, o remédio foi enviar a carta. Na missiva, a velha xingava o filho, moleque, sem-vergonha, descarado, safado. Menino gosta de molecagem, eu não poupava e até ajudava.
Em cidade do interior, tudo se sabe. A fofoca rola na praça, na esquina, na rua. O cabra teve conhecimento de quem escreveu a carta, a pedido de dona Júlia. Ele não veio até a mim. Enviou a digna esposa. Ela me disse tantas coisas. Parece que o criminoso era eu. Sempre fui um pequeno atrevido:
- Eu não tenho culpa, o que dona Júlia disse eu escrevi. Vá tomar satisfação com ela.
Aproveitei e disse a velha e ela respondeu:
- Deixe aquela cachorra vim conversar comigo.
Você foi, porque a mulher do Rafael também lá na casa de dona Júlia não apareceu.
Dona Júlia Galo não era de perder tempo. Sempre sonhou entrar na Igreja de Nossa Senhora Santana de saia e grinalda-de-noiva. Pois não é que a velha encontrou um marido, seu Santilho da Feirinha da Rola. Ela com mais de 7o anos e ele na casa dos oitenta anos. Foi um casamentão. Naquele tempo, o sonho maior das meninas era o casamento, muitas ficaram com inveja da velha, não pelo velho, é evidente, todavia, pela entrada na Igreja Matriz.
Tomara! Que dona Júlia e o velhinho Santilho estejam lá agarradinhos no céu.
SERÁ QUE O APELIDO DE JÚLIA GALO ERA O FOGO DE MINHA AMIGA!