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quarta-feira, 24 de novembro de 2010

O MUNDO É UMA PERDIÇÃO

O jegue rinchou às 3 horas da manhã. Dionísio tinha que meter os pés no mundo e ir embora para São Paulo. O dinheiro tinha conseguido da venda de uma vaquinha, presente de seu padrinho João Bebém.
O desejo de partir, se dependesse dele mesmo, não tinha, mas as circunstâncias lhe obrigavam. Fez nenhém com Verônica. A moça mais bonita do lugar, para complicar era de menor. O juiz de Direito, Dr. Lauro Pacheco , não perdoava: " ou casa ou vai para a cadeia." Pensava Dionísio:: " Nem cadeia, nem casamento, tenho que fugir, enquanto há tempo. " Seu João e dona Ingracinha dormiam, ainda cansados da feira de Simão Dias, que era no sábado. Tinha ambos ido a pé e voltado também da cidade.
A Feirinha da Rola sem luz, a claridade, naquele tempo , era do candeeiro, do lampião e da luz da lua. Que atraso! Mas o governador Sergipe era de Simão Dias, Dr. Sebastião Celso de Carvalho.
A notícia se espalhou na Feirinha da Rola, Verônica era uma moça perdida. Zé Malaquias, fofoqueiro de primeira linha, campeão da notícia de boca e boca , foi o maior responsável pela divulgação.
A beata Severina, virgem de corpo e alma, aconselhava as moças do lugar:
- Não ande com Verônica , pois é uma mulher perdida.
E as meninas daquele tempo, 1964, cumpria rigorosamente a recomendação da come hóstia.
Verônica chorava e o pai Anastácio:
- Cachorra, safada, bandida. Você ou casa ou vai para o cabaré do Bico-da-asa.
Verônica até pensou em se matar, mas lembrou de dona Lourdes, uma professora aposentada e religiosa:
- Minha filha, tudo tem seu tempo, diz as Escrituras. No momento de agonia, é preciso muita calma!
Verdade seja dita, Verônica não se arrependeu um tiquinho, até gostou de ter perdido o cabaço para o fugitivo. Medo tinha de ser lançada no olho da rua, de ficar com as pobres putas do cabaré do Bico-da-Asa.
Dionísio tinha 19 anos. Experiência com mulher nenhuma. Foi Verônica a primeira mulher que o sujeito papou. Quando menino transou com uma jega e também com uma bezerra. A bestialidade foi justicada em nome do tabu sexual da época. Coisa tão comum no interior do Nordeste Brasileiro.
Dionísio veio da Feirinha da Rola até Simão Dias a pé. Carro só milagre de santo macho. A sorte estava do lado de Dionísio, quando chegou na cidade dos capa-bodes, a marinete ia partir para Aracaju. O sujeito entrou no ônibus e conseguiu um lugar na janela. E lá ia Dionísio remoendo recordações, a queda do cavalo aos 8 anos, o chamego com os animais, o primeiro dia na escola.
o banho no rio. O primeiro prazer no banheiro. Tinha a impressão que ouvia de seu pai:
- Acorda, moleque, passarinho que não deve nada a ninguém já se acordou.
E o menino acordava para ir tirar o leite da vaca malhada.
Em São Paulo, os primeiros dias, dormiu na rodoviária, depois conseguiu uma vaga na pensão de dona Maria da Paz, uma viúva portuguesa, sem nenhum filho.
Anacreto, ajudante-de-ordem da pousada foi assassinado e dona Maria da Paz convidou Dionísio para trabalhar na pousada.
A velha Maria da Paz dizia aos hóspedes:
- Que tinha Dionísio como filho.
Só que todos sabiam , que Dionísio e Maria da Paz adormeciam na mesma cama.
Maria da Paz morreu do coração , mas deixou um testamento que favoreceu Dionísio.
Depois de 40 anos , Dionísio retornou à terra natal. Visitou a cova de seu pai e de sua mãe. Soube que Verônica passou uns dias no cabaré do Bico-da-Asa. Mas o cabo Jesus da polícia militar a levou como mulher. Tiveram três filhos: Anita e Silvia, professoras e André, oficial da polícia militar da Bahia.
Dionísio casou com a cearense Josefina. Do relacionamento, nasceram 4 filhas: Lindete, Josicleide, Maria e Dulcineia. Nenhuma casou, todas elas se tornaram mães solteiras. Duas netas de Dionísio: Sara e Cláudia engravidaram aos 13 anos. Dolores foi ser freira e Ana se amigou com Sandra.
E Dionísio sempre a dizer:

" O MUNDO É UMA PERDIÇÃO."